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terça-feira, 5 de junho de 2007

Forrest Gump: Um sensível contador de histórias nas asas de um tênis Nike

É, eu sei, o filme saiu há mais de dez anos. O que falar sobre ele que já não foi dito? Explico. Eu vi esse filme aos 17 anos. Algumas primaveras se passaram! Quando assisti amei, chorei e me emocionei muito, mas depois disso nunca mais o revi. Aí na noite de sábado passado, quando meus planos de sair naufragaram numa incessante chuva que caia lá fora, deu a chamada de Forrest Gump na TV italiana. Dublado (céus!). Tá, vamos lá, comecei a ver, afinal de contas é sempre mais uma oportunidade de exercitar o entendimento da língua. No entanto, foi bem mais que isso. Comecei a ver muitas coisas que não tinha visto aos 17 anos e dei razão ao Roberto Freire, mais uma vez, por ele ter dito que “a leitura do mundo precede a leitura da palavra”. Certamente aos 17 anos meu “horizonte de expectativas” não poderia alcançar tudo o que o filme oferece. Na verdade, ainda hoje não o é, e é justamente por isso que o filme é bom e que vale a pena ainda falar sobre ele.

A crítica, no entanto, não foi de todo positiva. O pólo Forrest e Jenny não foi visto com bons olhos. Forrest com seu QI abaixo da média e obediente às autoridades, que se deu bem, versus Jenny, um caráter “aparentemente” forte e rebelde, mas que a despeito disso sempre precisou da ajuda de Forrest e se "deu mal". Há aqui uma possível crítica do autor ao americano medíocre que se transforma em herói. Talvez seja possível ver a coisa por aí. Talvez. Mas, felizmente, os autores não controlam as suas obras depois que elas nascem. É possivel ver tantas outras coisas que, aos meus olhos, esse prisma perdeu a importância. Por isso, eu me uno mais uma vez ao público “ingênuo” que amou o filme e o viu como uma jornada heróica de Forrest.

Como vocês sabem, Forrest e Jenny se conheceram no ônibus escolar, e ele só pôde seguir viagem porque Jenny deixou ele sentar ao lado dela. Foi Jenny quem possibilitou a continuidade da história e deu o passe de Forrest no ônibus. Ali nasceu a amizade dos dois. Eles cresceram juntos e, quando chegou a vida adulta, ambos seguiram rumos muito diversos, embora complementares. O filme mostra os acontecimentos por eles vividos com o pano de fundo de 30 anos de história americana, começando pelo problema da discriminação racial, passando pela Guerra do Vietna, ao assassinato do Presidente Kennedy, até chegar nos anos 80.

Jenny, na narrativa, nos mostra o movimento hippie. No entanto, no caso dela, o amor livre se converte em relacionamentos violentos – possivelmente um reflexo da relação de abuso que teve com o pai que fica subtendida no filme – os ideais de paz e amor em fanatismo daqueles que a cercam e a tentativa de ampliar a mente em vício. Nos anos 70, Jenny está nas pistas da “disco” e a drogadição se agrava. Da maconha ela passa a cocaína. Chega a se prostituir e passa por algumas tentativas frustradas de suicídio. Nos anos 80 Jenny é outra. Quase uma “careta”. Trabalha de garçonete, tem um filho e não usa mais drogas. Mas Jenny ficou com uma herança da geração do amor livre, o vírus HIV.

A história de Forrest começa bem problemática: QI abaixo da média e sérios problemas de coluna. Porém, Forrest tem os cuidados e o amor da mãe e, desde pequeno, ensinado por ela, aprende a focar. “Mamma diceva sempre: La vita è uguale a una scatola di cioccolatini, non sai mai quello che ti capiterà”. ( Mamãe dizia sempre: A vida e como uma caixa de bombons, tu não sabes nunca aquilo que a ti está destinado/sucederá)

Forrest dribla seu problema de QI com a habilidade que adquire em correr, quando na volta da escola, junto de Jenny, ele é perseguido por alguns colegas. Incitado por ela a correr, na ocasião ele se livra dos ferros na perna e passa a correr mais que as bicicletas. Assim como Vulcano, Forrest tinha um andar claudicante e desengonçado. Ele deixa pra trás os ferros e adquire a mobilidade e a agilidade de Mercúrio, mas isso porque corre focado em somente correr. Italo Calvino, na sua segunda lição americana, a Rapidez, diz que Mercúrio e Vulcano se complementam. Ambos são descendentes de deuses, Mercúrio descende de Urano e Vulcano de Saturno. “Mercúrio e Vulcano portano ognuno il ricordo d'uno degli oscuri regni primordiali, trasformando ciò che era malattia distruttiva in qualità positiva: sintonia e focalità"( Mercúrio e Vulcano portam consigo a recordação de um dos mais obscuros reinos primordiais, tranformando o que era doença destrutiva em qualidade positiviva: sintonia e foco). Foi isso que Forrest fez a partir dali. O problema de coluna sumiu. Coluna e ossos são assuntos do Sr. Saturno, não é mesmo? Quando corria no campo da universidade, nas partidas de futebol americano, ele não pensava em mais nada além de correr. Com seu QI abaixo da média, Forrest se formou levado pelos pés velozes de Mercúrio e pelo foco de Vulcano. Quando salvou muitos dos seus companheiros no Vietnã, o foco dele era salvar Buba, seu grande amigo. Quando aprendeu ping pong no hospital depois de retornar da guerra, uniu novamente as qualidades de movimento e destreza de Mercúrio com o foco de Vulcano. Na cena, ele chega a dizer que aprendeu o jogo só focando e acompanhando o movimento da bolinha branca. Foi assim que ele se tornou um campeão de ping pong. Forrest, a despeito do seu QI abaixo do "normal" é Gêmeos e Virgem, Mercúrio e Vulcano, mobilidade e foco, participação no mundo e concentração construtiva.

A complementaridade de Mercúrio e Vulcano não para por aí, se dá também na narrativa em si, pois Forrest está sentado no banco, esperando o ônibus para reencontrar aquela que sempre foi o seu foco, e também o fio condutor da narrativa, Jenny. Ele conta a sua história aos que ali se sentam, assim como Dante nos conta sua descida ao inferno à procura de Beatriz, Forrest nos conta a busca da sua amada, da sua ânima, da condutora da sua alma e da história que ouvimos. Ele corre o mundo depois de ser deixado por Jenny. Sem saber pra onde, sem foco ele passa a correr sem saber bem o porquê e para quê, mas durante esse percurso ele se dá conta que só pensa na sua amada Jenny e assim ele retoma o foco da narrativa. Nas asas do seu tênis Nike, presente de Jenny, e segundo ele, o melhor presente que alguém poderia receber, Forrest conhece coisas, mantém a mobilidade e a destreza e vive outras aventuras. As metamorfoses de Forrest impressionam, pois ele passa de universitário jogador de futebol americano a soldado, depois a pescador e, por último, a jardineiro investidor da Apple.

Além disso, o filme Forrest Gump tem um ingrediente que sempre deu certo, o mesmo usado nas narrativas orais tradicionais: as formas simples! O narrador não se prende aos detalhes, ao contrário, os negligencia, deixando que o público os imagine. O narrador narra a sua seqüência de eventos de modo veloz e conciso, mantendo o ritmo da narrativa. O peso dos acontecimentos exibidos se contrapõe à leveza que o narrador dá a ela: leveza e movimento retratados na sensibilidade do narrador simbolizada pela pluma que surge ao início e ao final do filme, que vem voando e acaba por cair dentro da pasta de Forrest. No final, Forrest atinge o almejado: a sua Jenny, seu filho e sua narrativa, tudo isso com seus pés alados, sua paciência e com o ingrediente necessário a qualquer coisa nessa vida: amor!

2 commenti:

Acuio on 5 de junho de 2007 às 15:34 disse...

Dani,



fico com um orgulho besta. Conversamos ontem, à respeito, e tu com a sua pena nike "escrivinhou" Forrest, assim, como se correndo.

Passei na biblioteca e peguei as lições do Calvino. O Libriano lá é bárbaro.

Um beijo e continue bailando,

Acuio

Anônimo disse...

Nossa, esse seu post me ajudou e MUITO! ainda bem que existem pessoas como você no mundo rs. Eu estou fazendo um trabalho para a escola sobre o Filme Forrest Gump, onde tem que achar algum movimento que se passa no filme e relacionar com o movimento mesmo, tipo eu escolhi o Movimento Hippie e nesse post você fala justamente sobre a Jenny nos momentos "hippies" dela. Muito obrigada, beijos.

 

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